Hoje tenho o prazer de trazer para vocês a história de João Carlos Gandra da Silva Martins, um excelente pianista e maestro brasileiro. Ele é filho de um português nascido em Braga em 1898 e que faleceu em 2000 aos 102 anos.
Aos 10 anos seu pai já trabalhava numa gráfica, mas era fascinado pelo piano. No trabalho, teve o seu grande sonho interrompido quando uma prensa decepou-lhe o polegar.
Anos mais tarde, quando já estava morando em São Paulo e tinha uma situação financeira melhor, teve três filhos, transferindo assim o seu sonho de ser pianista para eles.
Para alegria de José, dois de seus filhos seguiram carreira de pianista, José Eduardo e João Carlos porém Ives se formou advogado, professor, escritor e jurista.
João Carlos começou seus estudos ainda menino, no dia em que seu pai comprou um piano. Aos oito anos venceu um concurso para executar obras de Bach. Começou a estudar no Liceu Pasteur e, com 11 anos já tinha aula com o maior professor de piano da época chegando a estudar piano por seis horas diárias. Toda essa dedicação lhe rendeu o 1º lugar no concurso da Sociedade Brito de São Petersburgo.
Seus primeiros concertos trouxeram a atenção de toda a crítica musical mundial. Foi escolhido no Festival Casals, dentre inúmeros candidatos das três Américas para dar o Recital Prêmio em Washington Aos vinte anos estreou no Carnegie Hall, patrocinado por Eleanor Roosevelt. Tocou com as maiores orquestras norte-americanas e gravou a obra completa de Bach para piano. Foi ele quem inaugurou o Glenn Gould Memorial em Toronto.
João Carlos Martins viu-se por diversas vezes privado de seu contato com o piano. Em 1965,sofreu uma queda durante um jogo treino da Portuguesa realizado no Central Park em Nova Iorque onde perfurou seu braço direito na altura do cotovelo, atingindo um nervo e provocando atrofia em três dedos, o que obrigou-o a parar de tocar por um ano.
Apesar disso, seu amor pelo piano era maior e João Carlos continuou a tocar mesmo com dificuldade até os 30 anos de idade. Voltou ao Brasil e tornou-se empresário de música e boxe por 7 anos, empresariando Eder Jofre, bicampeão mundial de boxe e que foi sua fonte inspiradora na volta triunfal ao piano.
Voltou aos palcos, com muita dificuldade, e depois de longos períodos de fisioterapia, recebeu novamente críticas positivas e foi aclamado pelo público. Entretanto desenvolveu distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (Dort), que o fez sair do palco mais de uma vez, e acabou se afastando novamente e começou sua fase de empresário ligado à política.
Apesar de todos os obstáculos, nunca desistiu da carreira musical e precisou fazer várias adaptações para continuar tocando.
Porém, no dia 20 de maio de 1995 foi golpeado com uma barra de ferro na cabeça durante um assalto na cidade de Sófia, Bulgária, o que provocou uma sequela neurológica que comprometeu o membro superior direito.
Por conta dessas sequelas, teve que fazer trabalhos de reprogramação cerebral para conseguir movimentar a mão direita e assim poder voltar a tocar com as duas mãos.
Sua determinação e paixão pelo piano eram impressionantes, entretanto João Carlos voltou a apresentar problemas no braço direito, e também na fala, precisando ser submetido a um novo procedimento cirúrgico.
Antes de realizar essa cirurgia, ele grava seu último álbum com as duas mãos.
Com o passar dos anos seu membro superior esquerdo, que estava saudável desenvolveu uma doença chamada contratura de Dupuytren, que causa contratura e espessamento da nas articulações da mão.
Diante de todo esse quadro, foi submetido a um novo procedimento cirúrgico, que infelizmente não impediu que ele perdesse os movimentos da mão esquerda.
Seria esse o fim de uma carreira tão brilhante?
Para alegria de todos nós, João Carlos não desistiu e resolveu começar a desenvolver uma nova habilidade: a de reger
Como já tinha bastante dificuldade de movimentar as mãos e já não tinha a agilidade necessária para reger e manusear as páginas da partitura com rapidez, para não prejudicar o andamento da música, João Carlos chegou a decorar cada nota da partitura.
Isso sim é empenho e paixão pelo que faz!
Em 2012 ele se submeteu a uma cirurgia no cérebro para a implantação de dois eletrodos do cérebro, com um estimulador eletrônico no peito, para recuperar os movimentos da mão esquerda, atrofiada,[ já que estava com a distonia bem avançada, atingindo todo o braço e não abria a mão há 10 anos.
João Carlos realiza também, na Faculdade de Música na Faculdade da Amazônia (FAAM), um programa de introdução à música com jovens carentes.
Em 07 de setembro de 2016 Martins executou o Hino Nacional Brasileiro durante a abertura dos Jogos paralímpicos de verão de 2016, além de ter tido a honra de ser um dos revezadores da tocha olímpica no mesmo ano..
Em agosto de 2017 foi lançado o filme "João, o Maestro", produzido pela LC Barreto e dirigido por Mauro Lima. Interpretam João Carlos Martins os atores Davi Campo longo, na infância, Rodrigo Pandolfo, na juventude, e Alexandre Nero, na idade adulta.
Em 2020, voltou a tocar com as duas mãos, mas dessa vez com a ajuda de uma luva biônica graças a um projeto desenvolvido em Sumaré, o fato ocorreu durante a comemoração dos 466 anos da cidade de São Paulo.
Toda sua trajetória de sucesso foi contada em dois livros: Saga das Mãos: A Impressionante Trajetória do Maestro e um dos Maiores Intérpretes de Bach e João de A a Z e também em dois documentários internacionais.
É por isso que além de talentoso o pianista e maestro João Carlos Martins é tão querido e aclamado pelo público.
Mesmo depois de tudo que sofreu, ele nunca desistiu de seus sonhos e ainda nos presenteou com um enorme exemplo de superação e amor á vida e á arte.
Grande abraço,
Marcela Redondo